Uma, duas, três, cinco, dez crianças. E e elas continuam chegando, todas animadas para bater um racha, jogar uma bolinha. Essa movimentação na quadra só existe graças a duas pessoas: a dona Terezinha e a Izabel. Mãe e filha são as idealizadoras do projeto Esporte e Cultura no Sertão, no distrito de Araquém, município de Coreaú, na região norte do Estado do Ceará. “Eu tive a felicidade de estudar aqui. Fui pra São Paulo ser costureira, me aventurei por lá, morando em uma favela chamada ‘Buraco Quente’, eu criei esse projeto”, recorda Terezinha. A ideia dela e da filha é, com a ajuda do esporte, tirar crianças e adolescentes das ruas e restaurar a família.
Três vezes por semana, cerca de quarenta crianças e adolescentes do município têm aula de futsal com um professor voluntário. A quadra não está em boas condições, mas é o único espaço para essa prática esportiva na cidade. Com o pouco que têm, mãe e filha fazem muito para alimentar os sonhos de cada criança em Araquém. “Muitas dessas crianças do nosso projeto não têm nem o que comer em casa. Quando eu cheguei aqui, em 2009, eu ganhei uma broa de um dos alunos, mas eu não gostei, disse que não tinha gosto de nada. Então, um deles disse: tem sim, tem gosto de bucho cheio, e isso é o que a gente come”, lembra Isabel Barbosa, idealizadora do projeto.
A realidade social dos alunos é bastante complicada. E ao entrar em contato com o dia a dia deles, Isabel não se conformou. “Eu fui analisando cada um deles e sabia que a minha mãe tinha os projetos dela lá em São Paulo. Por que não trazer um pra cá? Como a gente não pode resolver todos os problemas deles, sando um esporte e um lanche, quem sabe já não ajuda?”, se perguntava ela. Feito! Isabel e mãe voltaram de São Paulo e colocaram a ideia em prática. “Em São Paulo, eu estava em depressão profunda. Aqui, eu encontrei a alegria. Esses jovens são a alegria pra mim, um propósito na vida”desabafa.
A alegria contagiante de Terezinha se espalha para a garotada também. São meninos e meninas com poucas escolhas na vida, mas que, com meio período na escola e o resto do tempo no esporte, mantêm a mente ocupada e o corpo cansado de tanto correr atrás da bola na quadra. “Eu não jogava porque não tinha bola. Hoje eu agradeço a dona Terezinha por fazer esse jogo pra nós”, conta o garoto Jean Lima, de 11 anos. O sonho dele é o mesmo de milhares de crianças no nosso país. “Eu queria ser jogador de futebol. Esse projeto ajuda muito no meu sonho”, diz. Outro garoto repete: “O que eu mais gosto de fazer aqui é jogar bola. É a única coisa boa que tem pra fazer aqui na cidade: jogar bola”. O depoimento é do menino João Vitor de Oliveira, de 12 anos, que, enquanto fala, mexe a cabeça com o movimento de aprovação, de um sim para aquele projeto. Fica a sensação de que eles podem mais: ser e sonhar! “Eu sou corinthiano. Meu ídolo é o atacante Jô. Falaram pra gente que iriam trazer até jogador profissional pra jogar aqui. Eu fiquei curioso e estou esperando”, entrega João Vitor.
É o esporte no engajamento dos sonhos, da esperança e do social. “Eu sempre tive carinho pelo esporte. Tudo pra mim sempre teve esporte, cidadania e carinho pela família”, conta Terezinha. “A gente sabe que não consegue resolver os problemas de todo mundo, mas se puder resolver o problema de uma pessoa por dia, em um mês serão trinta. Conte os anos e veja quantas ajudas já demos”, comemora. A sensação de dever cumprido existe, mas isso não quer dizer que está bom assim. O projeto vive de doações e sempre precisa de ajuda – o que não desanima a dona Terezinha. “Tudo valeu a pena. Quando eu deito à noite na cama, sinto o carinho de Deus comigo. Conheço tanta gente, que tudo vale a pena”, finaliza. Se você quer conhecer mais desse projeto, visite o Esporte e Cultura no Sertão, em Coreaú.
fotos: Caio Ricard