Um exemplo de superação, cidadania e transformação por meio do esporte é a história de Marineide dos Santos, conhecida como Neide, que em sua paixão pelas corridas encontrou uma forma para superar o drama da perda de um filho ao mesmo tempo em que atua pela mudança social por meio do Projeto Vida Corrida. O projeto promove a inclusão social, saúde, autoestima e qualidade de vida para as meninas e mulheres do bairro Capão Redondo, na zona Sul da capital paulista, por meio do atletismo na modalidade corrida de rua.
O lema da Associação de Moradores Adventista da Cohab, “Mudança social com os pés e o coração”, reflete um pouco da história de vida de sua fundadora, Neide Santos. Baiana de Porto Seguro, conheceu o esporte aos 14 anos por meio de aulas de educação física na escola. Esse era seu único lazer, já que assim que a aula terminava, tinha que voltar para casa para trabalhar e cuidar dos irmãos. Certa vez, um professor de educação física a chamou para substituir uma aluna da escola numa competição de revezamento 4 x 100. Com as explicações básicas sobre a modalidade, sobre a qual não conhecia muito, ganhou sua primeira medalha. Daí decidiu: iria correr para o resto da vida e colecionar um monte de medalhas.
Mesmo com o incentivo do professor, que dizia que ela poderia vir a ser uma medalhista olímpica, Neide teve que abandonar os treinos para cuidar dos irmãos e trabalhar. Aos 20 anos, ficou viúva com um filho pequeno para criar. Casou-se novamente e teve outros dois filhos. Em 1998, as mulheres da comunidade do Capão Redondo a convidaram a ensinar-lhes a corrida no Parque Santo Dias, local em que praticava a atividade física. Então formou seu primeiro grupo de corrida.
Vendo sua atuação com as mulheres, um de seus filhos sempre lhe pedia para atender às crianças da comunidade, que a seu ver, estavam “se perdendo” pela falta de orientação e atividades de lazer. Esse mesmo filho morreu em setembro de 2000 em decorrência de um assalto praticado por um menor de idade. Em seu momento de luto, Neide decidiu: teria de reescrever sua própria história.
Com a ajuda das mulheres do grupo de corrida, Neide começou a atender às crianças do bairro. Dessa forma nascia o Projeto Vida Corrida, que começou oficialmente em 1999, e contava com 6 integrantes; conta atualmente com mais de 350 participantes, dentre esses 87% são mulheres e meninas com idade entre 4 e 80 anos.
Os treinamentos de corrida de rua acontecem dentro do Parque Santo Dias, no bairro do Capão Redondo, zona Sul da cidade de São Paulo. As atividades desenvolvidas reforçam o vínculo comunitário entre os participantes e contribuem para fortalecer os laços familiares, uma vez que as mães convidam outros membros da família para participar. Além disso, promove uma interação entre os moradores com o parque e o equipamento público.
A relevância do projeto já foi reconhecida em diversas oportunidades, a exemplo da 10ª edição do Prêmio Anu, que é um prêmio realizado pela Central Única das Favelas (CUFA) cujo intuito é destacar todos os tipos de ações ocorridas dentro de favelas brasileiras, que contribuam para o desenvolvimento humano e social da comunidade, entre outros.
Em 2016, Neide teve a oportunidade de conduzir a tocha olímpica. “Com tudo isso realizado, não só eu, como uma comunidade inteira começou a se sentir importante. Esses acontecimentos fizeram com que todos vissem que o que a gente faz é relevante. E continuamos trabalhando para continuar a conquista diária: num passo na frente a frente do outro”, considera.